Após decisão do Supremo Tribunal Federal, que considerou a infecção pelo novo coronavírus como doença ocupacional, atenção aos funcionários deve ser redobrada
Santa Cruz do Sul – Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucionais os artigos 29 e o 31 da Medida Provisória (MP) 927, editada pela União. A MP concentra as medidas econômicas para o combate aos efeitos nocivos na economia, provocados pela pandemia do novo coronavírus.
O advogado Guilherme Valentini, sócio do BVK Advogados explica que o artigo 29 previa que, nos casos de contaminação pelo novo coronavírus, os afastamentos de funcionários não seriam considerados como doença ocupacional, exceto quando houvesse a comprovação que a doença teria sido contraída no ambiente de trabalho. “Este artigo foi suspenso pelo Supremo e com isso perdeu a aplicabilidade, por ser considerado inconstitucional pelo STF”, justifica Valentini, especialista nas áreas do Direito Trabalhista e Tributário.
O advogado explica que o governo federal ao publicar a MP entendeu que a Covid-19, por ser uma infecção causada por uma pandemia, não deveria ser classificada como doença ocupacional, pois as empresas não teriam ingerência sobre ela, assim, não teriam culpa, caso algum empregado fosse infectado pelo novo coronavírus. “Esta culpa ocorreria apenas quando comprovado que o trabalhador contraiu a infecção no ambiente de trabalho. A decisão do STF inverteu a situação, tornando a Covid-19, na prática, em uma doença ocupacional”, alerta.
Em termos práticos, o especialista adverte que com a decretação de inconstitucionalidade do artigo, as empresas vão ter que tomar todos os cuidados. Observarem com muito critério o que dizem os decretos estaduais e municipais, para tomarem todas as medidas necessárias à prevenção dos trabalhadores e de seus clientes. “Principalmente documentar tudo, por meio da anotação nas planilhas, com a criação de ficha de equipamento de proteção individual (EPI), com a assinatura dos empregados”, diz.
Valentini destaca que é necessário que sejam respeitados o revezamento de funcionários, os limites de concentração de clientes, a higienização do espaço, o uso de álcool em gel, que fazem parte de uma série de cuidados adotados pelas autoridades de saúde. “Tudo tem que ser realizado para se evitar que a doença seja contraída no ambiente de trabalho e devidamente documentado”, pontua.
O especialista diz que os ministros do STF entenderam que os trabalhadores do ramo da saúde seriam os maiores prejudicados com a manutenção redação original da MP, no caso de contaminação com a Covid-19 nos seus ambientes de trabalho. Valentini diz que que estes profissionais já teriam como comprovar se tratar de doença ocupacional pela exceção que era prevista no artigo 29, até pelo nexo evidente com suas atividades. “Ao derrubar esta norma, o STF acaba jogando no colo de todas as outras empresas a responsabilidade e este possível passivo trabalhista, pois muitas empresas não têm este risco de contaminação, igual a um hospital ou uma clínica, por exemplo”, apontou o especialista.
Entenda a diferença entre doença comum e doença ocupacional
Uma doença comum, que pode acometer qualquer trabalhador, pode gerar uma incapacidade parcial ou total, por tempo determinado ou permanente. Ela gera um benefício previdenciário chamado de Auxílio Doença Previdenciário Comum. “Uma doença cardíaca, por exemplo, que acomete um trabalhador comum. Ela é uma doença que pode ser incapacitante, mas que não está vinculada ao trabalho. Já uma pessoa que foi acometida de uma doença que tem ligação com este trabalho, ou seja, foi adquirida no ambiente de trabalho é uma doença ocupacional”, difere Guilherme Valentini.
O especialista explica que uma doença ocupacional é equiparada por lei a um acidente de trabalho. Segundo Valentini, a doença ocupacional gera uma série de direitos junto a Previdência. “Além do afastamento inicial de 15 dias, o trabalhador com doença ocupacional terá o contrato suspenso e irá receber do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), até que tenha a alta médica”, explica o especialista.
Conforme o advogado, ao receber a alta médica e retornar às suas atividades, este trabalhador retorna ao emprego com estabilidade de um ano. “Durante o período de afastamento, a empresa irá recolher o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), e mais adiante, este trabalhador pode receber um dano moral por esta doença, ou em caso de morte ou invalidez permanente, este trabalhador, ou seus familiares, podem receber uma pensão vitalícia”, declara Valentini.
Já no caso de uma doença comum, exemplifica o advogado, o trabalhador que é afastado, recebe do INSS seu benefício e quando retorna da alta médica não tem a estabilidade. No período de afastamento, a empresa também não precisa recolher o FGTS. “Quando comparada uma com a outra, existem muito mais direitos ao trabalhador e obrigações ao empregador, quando a doença é considerada uma doença ocupacional, em relação a uma doença comum”, complementou o especialista.